domingo, 24 de julho de 2016

FEIRA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL - RELATOS (III)


Embarque no Saco do Sombrio com Rê, Vera & Cia (Arquivo História)


TIRANDO DA PEDRA, COLOCANDO NA REDE
                                                                   Pedro Antônio dos Santos

No final da década de 1980 até os primeiros anos da década de 1990, os professores Pedro e Vera, meus  compadres, viveram na Ilha dos Búzios, no arquipélago da Ilhabela. Sibila e Pedrinho, a prole de então, eram duas graciosas crianças. Neste relato aparece a contribuição deles à Feira de Educação, de 1993.

Introdução:
Esse projeto foi possível graças ao Curso de Mitilicultura oferecido pelo Instituto de Pesca, pelo fato da Ilha dos Búzios possuir excelente banco de sementes e também devido à carência da comunidade local por novas alternativas econômicas.
Fazendo cursos, participando de encontros, procurando as mais diversas instituições, além de pesquisar (costumes e necessidades) e consultar personalidades diversas do local e de “fora”, procurando entender o processo de cultura em que nos inseríamos como profissionais da Educação e também como “moradores”, descortinou-se um mundo de situações em que a técnica haveria de ser repensada e, as adaptações que se faziam necessárias iam além de criatividade e da motivação “do momento” (de aula), pois o que se vê simples e comum nem sempre o é. E aqui não foi diferente.

Desenvolvimento:
Em janeiro houve o curso... e quando foi colocada a ideia de acompanhamento do trabalho escolar, aproveitamos o trabalho que a comunidade vinha desenvolvendo e aplicamos como tema central das atividades escolares, já que o mesmo motivava bastante, sendo de domínio das crianças a situação que envolve a captura, venda, alimentação e o ambiente em que vive o animal. Aqui vai um adendo: o sentido, as expressões e o próprio significado das palavras têm características que na comunicação geral passam despercebidas. Explico melhor: a expressão oral se faz, porém sem definição das ideias trocadas; isto quando a comunicação é feita com pessoas de fora da comunidade. Passamos então a organizar os conteúdos que poderiam ser desenvolvidos mantendo a interdisciplinaridade, sem forçar uma “nova matéria”, pois isso ficaria para o momento da ação, orientado pela motivação e necessidade.
A partir do roteiro básico, dentro da Proposta Curricular, de seu conteúdo, idealizamos algumas atividades globais que norteariam o trabalho: a- excursão à costeira, b- classificação dos seres da costeira, c- coleta de mexilhões para a semeadura (separação – panela – dimensionamento), d- semeadura, e- fundeio, f-monitoração, g- coleta, h- discussão conclusiva ou final.
Para a execução desse roteiro levaríamos o ano inteiro, o que nos incentivava – e muito! – já que formaria um elo evolutivo não só dos conteúdos das disciplinas, mas da vida em si que enriqueceria em muito a compreensão, pelas crianças, da necessidade diária de trabalho para consecução de qualquer “coisa” (profissão, estudo, crescimento corporal etc.). Uniríamos o todo às suas partes.
Essas atividades dariam margem no cotidiano escolar a todo desenrolar programático das disciplinas já que, de cada uma delas surgiriam: textos orais e escritos, palavras novas e novos significados das palavras conhecidas (exemplo: costeira e Costeira não diferem no oral, porém para as crianças “dos Búzios”, Costeira é um bairro e costeira de pedras...). E sem dar menos importância, estaríamos trabalhando a HARMONIA, ou seja, com a compreensão dos processos de desenvolvimento, de todos os mecanismos e necessidades que envolvem os seres. Nossos alunos estariam compreendendo a si, aprendendo a estabelecerem  relações com os demais seres e o ambiente no todo e nas partes, formando conceitos que os habilitem a um desenvolvimento sustentado” em todos os setores da vida.

Algumas pessoas da comunidade toparam o projeto. E, valendo-se da tradição da comunidade local, o Sr. Maneco, na primeira oportunidade em terra, preparou as âncoras e cabos remendados (tudo improvisado), garateias velhas etc. O material básico utilizado na colocação das tiras e boias foi improvisado no próprio local. Começamos então a trabalhar o tema com os alunos através dos conceitos sobre o ambiente entremarés costeira.  (É bom lembrar que na Ilha dos Búzios não existe nenhuma praia). As sementes (pequenos exemplares selecionados de mexilhão) para confecção das redes foram tiradas na costeira próxima à escola. Nesta fase os alunos observaram e discutiram a vida dos seres no ambiente de costeira fazendo a relação do conhecimento “local” com o “escolar”, ou seja, houve uma grande troca onde eles colocaram todo seu conhecimento prévio como comunidade e nós transmitimos nossos conteúdos enquanto educadores. Assim, enquanto a ideia era trabalhada em sala de aula com texto (alfabetização) e outras atividades, o cabo do “long line” foi fundeado com a participação dos alunos e da comunidade. O material improvisado não oferecia resistência adequada, necessitando do máximo de cuidado, levando-se em conta o uso de canoa e condições de tempo. O processo seguiu com comentários constantes em aula, onde se analisava as opções que a mitilicultura oferecia aos alunos e comunidade em geral.

Desdobramentos:
M E X I L H Ã O → lixo → lixão  →  - Onde fica? – No buraco.  –É? Como? – Tudo junto? – Não! – Então como se faz? – Faz adubo! – Onde?  - No buraco! – E do buraco vai pra onde? – Vai pro Saco!
LIXO – higiene – saúde. REMÉDIO – saúde. PLANTAÇÃO – alimentação – geração de renda – saúde.
QUEIMADA – extinção de madeira para canoa – artesanato.
MATA – animais – criação – caça.

Aspectos positivos:
A mitilicultura é hoje uma alternativa econômica viável e desejável, possibilitando ao pescador manter sua “renda” em períodos de defeso e ainda oferece outras possibilidades que a pesquisa nos revelará. Sendo assim se justifica a necessidade de incluí-la nas atividades escolares em nosso município, unindo “economicidade e preservação”. A cultura dos mexilhões sendo bem orientada pode ser um estímulo à preservação.

Aspectos negativos:
O IP (Instituto de Pesca) e a CATI (Coordenadoria de Assistência Técnica Integral) supervisionaram a experiência qualificando-a como bem sucedida já que, conforme o mapeamento feito pelos oceanógrafos, o Saco das Guanxumas, localizado na Ilha dos Búzios, era inadequado para o cultivo. O Instituto de Pesca disse que o crescimento das sementes estava muito bom e que a colheita deveria acontecer com sucesso. O triste da história é que o cabo afundou durante as férias escolares e não se efetivou a colheita, não havendo assim a possibilidade de avaliação do que realmente aconteceu. Porém, toda a experiência mostrou a simplicidade da técnica e a viabilidade do trabalho tanto com o aluno como com a comunidade. Não foi feita a avaliação por não terem recolhido os cabos, mas a comunidade se convenceu da viabilidade do cultivo, representando uma grande vitória pela tradição de resistência desse tipo de comunidade.

Conclusão:

A aplicação do projeto trouxe resultados além dos esperados pois, além da gratificação da realização em si, conseguiu-se um intercâmbio com a CATI (Engenheiro Agrônomo Maurício P.R. Alves) e IP (Sérgio Ostini) que “visitaram” o micro-line (espinhel de mexilhão) considerando válido o experimento, visto que os mexilhões se fixaram bem, desenvolvendo-se dentro dos padrões. No aspecto escolar foi grandioso, pois as crianças verificaram sobre aquilo que acreditavam já saber tudo, aprenderam novidades e curiosidades. Puderam manipular e monitorar o desenvolvimento enquanto trocavam conhecimentos e tiravam dúvidas. A maior delas era: “Será que cresce na corda?”. A comunidade, mesmo quem era jovem, achava que não daria certo. Ou seja, com a conclusão do projeto o efeito do trabalho foi maior, mostrando assim como atividade de Educação Ambiental integradas ao currículo, de forma interdisciplinar, rendem um aprendizado concreto e construído ali mesmo, no contexto cultural. 

sexta-feira, 22 de julho de 2016

DO MUTIRÃO DO TEMPO



Lá longe...nove anos atrás: Genésio, Estevan e eu (Arquivo JRS)
No dia 1º de abril de 2007, eu, Jairo e Estevan amanhecemos cedo na casa do Seo Genésio. Que domingo maravilhoso! Fomos à roça, tomamos um delicioso café com mandioca preparado pela Dona Irene e depois emendamos na prosa, cujo início foi: "O meu pai dizia que eu não vi nada. Eu já vi alguma coisas, mas o meu pai dizia que eu não vi nada. E é verdade! E vocês que estão vivendo hoje, começam logo a ver e a turma dá risada".

O amigo Santiago, em suas páginas, avança na alma caiçara, sobretudo quando mostra esse valoroso caiçara do Cambury. Valeu, irmão!


Do mutirão do tempo
(Para seu Genésio, para Cambury, para a Terra)


Do alto de sua varanda branca, um olhar de quase noventa anos observa em silêncio os últimos reflexos dos raios de sol se esgueirando lentamente por detrás do mar de morros verdes... Dedos encurvados pelo tempo e pela lida, na roça, no mar, no viver que não se vive mais, mas lembra... Um rosto como que entalhado na madeira, como as antigas canoas. O sal e o sol das rugas, quase um século de ser!! A lucidez não apenas dos que viveram muito, mas dos que vivem muito ainda, dentro, de tudo aquilo que viu e lembra como a chama viva de um lampião!

Do alto de um olhar de quase noventa anos, suave, longínquo e profundo como as tocas dos meros, como o mar aberto, um pensamento flutua na tarde azul e quem saberá para onde vai, de onde vem, nesse oceano de histórias e lembranças marcadas na pele e na alma!! 
Como chegar às ilhas quando não se navega mais?! Como não ser ilha, cercado de tempo por todos os lados?!Como extrair da terra o que as mãos não mais alcançam ?! O olhar vagueia no vento que derruba as últimas flores de jambo da tarde! Sútil tapete rosa de pétalas onde pés descalços descansam da longa jornada! Uma mochila estradeira como travesseiro!
Onde voa a memória quando o sono espreita as sobrancelhas cansadas?! Para onde andariam esses pés se retomassem o vigor da juventude solta por estas matas e praias?!
Mas o tempo... apenas cumpre seu papel na existência de tudo! O tempo é só mais um caminhante no mundo! 
Da varanda branca e calma um olhar de quase noventa anos vê crianças correndo nas trilhas abaixo, penduradas nas árvores, pulando no rio, vê a si mesmo nessas crianças e sabe coisas junto com elas que só sabe quem vive no coração da vida!! Mas não há tristeza, mesmo com as coisas que se foram e não voltam mais! Assim são feitas as coisas, assim somos feitos nós, para passarmos, para deixar de ser... 
O que há é um tipo de serenidade! E uma profundidade! Às vezes mais densa, como um mar mexido, às vezes como um navegar tranquilo, mas, nenhum mistério, apenas a vida vivida em sua plenitude! Lembranças remam na mente fluída... O velho gosto e cheiro do café de cana, do peixe assado, as lidas, as lutas, as luas, o lar... os camaradas, o fandango, a rabeca, a noite, o cantar e o contar, com tudo que a noite têm de estrelas e de lendas!
E o mutirão!
Mutirão... os antigos caiçaras o faziam na época da roçada, no preparo do terreno, plantio, colheita...Tanto os caiçaras quanto os quilombolas herdaram a coivara, o rústico sistema de plantio, dos índios nativos, que há séculos não caminham mais por este chão, mas são muitos por debaixo dele!! 
Plantamos nossas sementes sobre a memória do chão! Nascerão lembranças renovadas pelas chuvas?!
Do tradicional plantio da mandioca, da batata-doce... poucos continuam, "as roças são altas, as leis... o cansaço... os jovens tem outros saberes e interesses, as pessoas mudam como as marés, sabe". 
Sabemos, ou apenas pensamos que sabemos... 
" Nunca mais vi um mutirão caiçara, eles já se foram, estão no mesmo lugar onde está o tempo que os apagou." 
Mas do pouco que sabemos vamos seguindo e tentando fazer alguma coisa, que se não pode ser igual ao de antigamente, nem precisa, pode ser sincera também, como antigamente. 
E o tempo da sinceridade é sempre o tempo em que se está! 
Mas... do alto das cabeças dos morros um barulho longe de enxadas e facões voa no vento que caminha sobre os telhados rústicos e esbarra nas barrancas do rio remexendo de leve as águas! Vozes e ferramentas cantando a canção da terra trabalhada! Parece até que o tempo andou para trás e reencontrou um antigo momento acontecendo... Mas o tempo não volta, ele apenas nos mostra o quanto podemos aprender com os que vieram antes, caminhando, regando a terra com o próprio suor, cultivando, plantando e colhendo o dia de hoje para os de hoje e para que os que vierem amanhã possam plantar o dia deles nesse endereço chão!! 
As trilhas vazias do quilombo e da praia escutam dentro do silêncio de uma tarde nublada de um sábado solto no universo, a canção lenta e ritmada das ferramentas aprendendo com a terra! Em algum morro alto e distante, mãos e pés vão se calejando e plantando mudas e sementes, sementes que são feitas da mesma substância que moldou todos os seres! Mãos que vieram de várias partes do mundo e se encontraram aqui, para o gesto de aproximação, o toque, o pulsar do chão, o trabalho em união!
E enquanto o mundo parece parado na amplidão da paisagem serena do mar... do alto de uma varanda simples, de paredes brancas, um olhar de quase um século escuta essa canção, e fecha os olhos e a vê, como se ela viesse diretamente de suas veias, de seus músculos envelhecidos e cansados. E leve como uma pétala de flor de jambo, um sorriso serenado abençoa a tarde. Ele sabe... A sua semente brotou! E, olhos semiabertos, em silêncio profundo, medita em paz na grande noite que um dia abraça a humanidade!

quinta-feira, 14 de julho de 2016

QUE TAL SER PROIBIDO DE IR À PRAIA DE FORA?

Não vai lutar por isto? (Arquivo JRS)
... Então também não vai apreciar isto. (Arquivo JRS)

      O amigo Peter continua publicando uns temas desafiadores para nós que valorizamos as belezas naturais, os caminhos tradicionais (Caminhos de Servidão) e somos contra o exclusivismo que alguns pretendem no espaço que é de todos, resultando em enclaves fortificados que, via de regra, despejam seus esgotos por ali mesmo, sem respeito à costeira, aos veios d'água, aos outros seres que compartilham desse meio ambiente litorâneo e aos demais cidadãos.


Que tal ser proibido de ter acesso à Praia de Fora, Praia do Tapiá, Praia do Codóis [Maria Godói] e também ser proibido de pescar em todos os pesqueiros tradicionais da Ponta do Espia? Estão vendendo os pesqueiros: Praia do Tapiá, Costão Quebrado, Cafarnaum, Praia de Fora, Praia do Codóis, Ponta do Meio, Itapeva, Ponta do Espia, Saco do Soldado, Pedra do Cerco, Saco do Espia, Pedra do Arpoador, Saco da Piteira, Saco Grande, Poço Fundo, Cara Pro Mato, Porto Velho, Porto do Antônio Inácio, Pedra da Cadeira, Porto da Idália, Pedra do Morcego, Figueirinha, Porto da Cruz, Os Cafés, Pedra Rachada, Pedra da Laje, fora os do largo. [E as praias da Pixirica e da Xandra? E o Pesqueiro do Migué Firme? E o Canto das Irmãs? E a Grota do Bugio?  E o Corgo da Zefa? E o Arto do Cambucá? E a Tiguera do Formigueiro? E o que farão com o Eito do Bacupari? Etc...etc...etc...]

Aqui: 1- http://www.ubaweb.com/revista/g_mascara.php?grc=34976
2- http://www.ubaweb.com/revista/g_mascara.php?grc=31708

Aqui: http://canoadepau.blogspot.com.br/2013/10/os-perigos-das-trilhas-de-ubatuba.html

Aqui: http://coisasdecaicara.blogspot.com.br/2013/10/dia-de-andar.html

Aqui: 1- http://trekkingnamontanha.blogspot.com.br/2014/01/trilhas-e-praias-da-ponta-da-espia.html

2- https://picasaweb.google.com/116531899108747189520/TrilhasEPraiasNaPontaDaEspiaUbatubaSPDez13

Aqui: 1- http://canoadepau.blogspot.com.br/2013/05/cetesb-sim-sim-sim.html
2- http://canoadepau.blogspot.com.br/2013/09/o-infeliz-destino-de-nossos-parques.html

Aqui: http://www.informarubatuba.com/#!gerco-mapa-consenso-ubatuba-conselho/c17mp

Aqui: https://www.facebook.com/AARCCA/posts/1763301877248195

Estão privatizando os espaços públicos, bens comuns de uso do povo que foram "preservados" à custa de muita injustiça socioambiental para com o povo Caiçara.

"O 'meio ambiente' foi bom sabe pra quem? Pros... pros, cara...  que vieram pra explorá Ubatuba, assim, Caraguatatuba, todo o litoral, é os grileiro. Então isso foi bom. Então o 'meio ambiente' ele foi bom, pelos (para os) grileiros que apareceram. Mas pela classe que sempre respeitaram o 'meio ambiente', eles prejudicaram. Que é os pescador... é os antigo... é o roceiro, é o cara que sempre criou o filho com farinha e palmito... entendeu?" 
(Depoimento de pescador Caiçara, sexagenário, local da Ponta do Espia, anotação de campo em julho de 2016)

Foto: Rafael Santiago
Foto: Rafael Santiago
FONTE: canoadepau.blogspot.com

quarta-feira, 6 de julho de 2016

MUITO MAIS QUE UMA SALGA



 
Festa de confraternização na Salga Iwashi (Arquivo Igawa)

Na presente parte, entenderemos outros fatores que forçam o Sr. Igawa a deixar a atividade ligada à pesca. O legal disso tudo é que seus empreendimentos uniram pessoas, trouxeram gente boa para habitar aqui, dando sua contribuição à civilidade ubatubense.

Novo empreendimento:
       Com a melhora nas finanças investe na área de turismo pois tem um terreno até então ocioso cujo IPTU absorve parte do lucro da salga. Em 1984 é inaugurado o Itaguá Camping.

Nova crise:
      Novamente não há matéria prima para trabalhar, agora bem mais grave. Junto a várias outras razões, o derramamento de óleo por duas vezes em S. Sebastião acarreta o sumiço dos cardumes de peixes, além das sardinhas, carapaus, peixes-galos, porquinhos, espadas, e, das pedras enegrecidas pelo óleo, sumiram as anêmonas, pepinos-do-mar, lesmas-do-mar, sapinhauás. Pela falta de perspectivas, são vendidos os dois barcos. A salga encerra suas atividades  em 1992.  Um tempo depois, em 1994, a fábrica de gelo é fechada.

Dos funcionários:
        Muitos funcionários passaram a trabalhar no camping, foi uma situação de adaptação. Porém como dizia o Sr. Altivo ( que aposentou-se pelo camping e desde que saiu do alojamento foi morar em casa própria na Estufa ), era “trabalho mais leve” e acabaram por se aposentar por lá. O Dito, trabalhador desde o começo da salga, hoje é aposentado, mora  em casa própria no Ipiranguinha,  continua na labuta com horário diferenciado. Já o Emídio (também desde o início da salga),  aposentou-se e ficou morando em casa da empresa até sua morte há alguns anos atrás . Lilo, gerente do camping, quando adolescente foi auxiliar de escritório da salga. E outros vários funcionários e suas famílias saíram das moradias da empresa para sua casa própria.

Outras histórias:
    Sr. Irineu Stoppa mudou-se de  Ubatuba com os filhos adolescentes. Foi para São Paulo em 1976, mas continuou na empresa assessorando  a parte de contadoria e administração do camping durante as temporadas até o ano de 1998. Voltou para sua terra natal, Lençóis Paulista.
         Sr. Jorge  Todan, construtor, veio do Paraná com a família; por aqui ficou e hoje um de seus descendentes Sr. Flávio Todan tem empresa de mecânica de carros em Ubatuba.
      Cláudio, do setor de gelo, vindo de Catuçaba, morava no alojamento; cortava os cabelos de outros rapazes na época. Hoje tem seu salão de barbearia na Hans Staden, próximo ao calçadão.
       Na salga trabalhavam muitas mulheres, casadas e solteiras, e na fábrica de gelo muitos rapazes, vindos de fora ou não. Algumas crianças da vizinhança  montavam caixetas de madeira quando era necessário. A Jaci era casada com o Preto e mãe de 3 adolescentes. Depois se apaixonou pelo Donizetti (do gelo), estão juntos até hoje e tiveram dois filhos.
        Sr. Miúra deixou a salga e a moradia com a família em 1976 e foi trabalhar na lavoura no Rio Escuro. Vendia seus produtos na feirinha de Ubatuba  com a ajuda dos 6 filhos, hoje todos engenheiros, sendo que um deles é formado no Ita (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) .
       Dona Júlia era da salga; seu Valter seu marido, motorista da empresa. Morou uns tempos no alojamento depois de viúva, aposentou-se mas continuou por um bom tempo ajudando na lida das três netas do Sr. Igawa. Hoje com 87 anos, 4 filhos, um tanto de netos e 13 bisnetos, mora com o filho Ricardo na Estufa 2.

         De Santa Mariana, no Paraná, veio um casal que ficou pouco tempo, mas o tempo necessário para que Marina  viesse visitar a irmã  nas  férias; acabou se relacionando com um dos filhos do Makiyama, por aqui ficou e se tornou mesmo uma cidadã ubatubense , foi professora , vereadora e nos últimos tempos de sua vida cuidava em fazer jardins pela cidade.







terça-feira, 5 de julho de 2016

FEIRA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL - RELATOS (II)



Praia Mansa - Ilhabela (Arquivo JRS)
Eis o segundo relato da I Feira de Educação Ambiental. Boa leitura!

DE ÁRVORE E DE CANOA
                                            Marina Martins de Carvalho

Origem:
Na sala de professores da Escola Gabriel Ribeiro dos Santos (Ilhabela), no primeiro semestre de 1993, ouvi o comentário seguinte: “Aqui em Ilhabela havia, outrora, uma excelente madeira para fazer canoas; foi tão explorada, fizeram tantas canoas – até para vender no continente – que a árvore foi extinta; restam apenas alguns exemplares no outro lado da Ilha”.
Interessada nos problemas ambientais e sensibilizada pelos cursos da Fundação Living Earth – Vivendo a Terra – no Litoral Norte de São Paulo e pela recente implantação das escolas padrão, pensei logo que poderíamos fazer uma pesquisa para apurar a veracidade daquela informação e, eventualmente, promover o replantio da preciosa árvore neste lado da Ilha.
Expus o projeto às minhas alunas da 3ª série do Curso de Habilitação Específica para o Magistério. Elas se dispuseram a entrevistar pescadores, canoeiros, quaisquer moradores da Ilhabela que tivessem conhecimento do assunto. Eu já conseguira o nome de pessoas que estariam dispostas a conceder entrevistas e as professorandas conseguiram outros nomes.
As 33 alunas foram distribuídas em grupos de quatro, com uma coordenadora, entrevistaram 15 pessoas e apresentaram-me os oito relatórios que também foram utilizados pela professora de Língua Portuguesa (Yole), como nota de um bimestre.

Especificação da Pesquisa:
·        Pessoas entrevistadas:
José Antônio Matias dos Santos, 67 anos, pescador aposentado
Benedito Moraes Filho, 52 anos, taxista e canoeiro
Marco Rafael de Souza, marceneiro
Antonio Rafael de Souza, 74 anos, canoeiro
José Alves Passos, 59 anos, serviços gerais na Escola Maria Gemma
José Antonio S. Gonzalez, 40 anos, professor e artesão
Jessé Araujo dos Santos, 43 anos, gerente local da Cesp de Ilhabela
Paulo Rodrigues de Oliveira, 70 anos, canoeiro
José Romão, 54 anos, pescador
Pedro Basílio da Silva, marinheiro aposentado
José Leopoldino, trabalha na Sucem
Pedro Paulo, diretor da Secretaria de Meio Ambiente de Ilhabela
Pedro, 73 anos, canoeiro
Benedito Santana de Morais
Paulo Andrade Molinari, Presidente da Colônia de Pescadores de Ilhabela

·        Entrevistadoras:

Elaine, Simone, Alda, Ofélia; Marly, Márcia, Nereide, Caroline; Eliane, Ana Paula, Andréia, Elciléia; Cleidemara, Léia, Leonice, Fernanda C.; Wanessa, Carmen, Fernanda S.; Lídia, Darilene, Meire, Raquel; Luciana C., Marluce, Bianca, Renata; Luciana, Lilian, Priscilla, Tatiane.
·        Coordenadora: Maria Cristina
·        Local: Ilhabela, São Paulo
·        Época: Primeiro semestre do ano letivo de 1993
·        Organizadora: Profª Marina (Filosofia Educacional e Conteúdo e Métodos do Ensino de Estudos Sociais)

Análise dos Relatórios:
·  Árvores citadas:
Ingá, Figueira, Cedro, Guapuruvu, Jequitibá, Urucurana, Canela, Pequiá, Nogueira, Cabreúva, Louro, Vinhático, Jaqueira, Ipê, Coabirana, Noz moscada, Tamanqueira, Jacataúba, Tapiá, embiruçu, arariba, óleo branco, quabirana, içá, paina, angibins, sapupuva, abataria, bucuiba, ariticum, pau d’alho, gratauna, chapéu de sol, pau brasill, maçaranduba, indaiauba, mangueira (sugerida pelas entrevistadoras, mas descartada porque é “muito curta, só dá pra canoa pequena: não compensa”) e bataia.
Foram mencionadas duas madeiras próprias só para artesanato: a cupiúba (pouco resistente) e a caxeta (porque é mole).
Pelo menos em Ilhabela, com 51 espécies de árvores podemos fazer canoas, contando-se as variantes como ingá vermelho e ingá canela, figueira limão e figueira cipó etc.
Duas foram indicadas como a “mais usada”: a nogueira e o guapuruvu.
Só o jequitibá e o cedro foram classificados árvores ameaçadas de extinção.
Só uma contradição foi encontrada: sobre o pequiá. Dois depoentes disseram que essa árvore é contraindicada para canoas, mas outro elogia o pequiá contando que com um só tronco fez três canoas além de pequenos utensílios.
Além desses dados que serviram para elucidar a proposta da pesquisa, algumas outras informações paralelas foram recolhidas e poderão, no futuro, engendrar outros tipos de reflexão e atividades em benefício da comunidade.

Conclusão:
Aparentemente, os entrevistados não têm notícia do desaparecimento de árvore ligada  à confecção de canoas.
Dois deles disseram que houve derrubada indiscriminada de árvores de todos os tipos: um alegou que foi para a formação urbana da Vila e outro, para comercialização de canoas fora daqui e para fazer mesinhas, mourões, bancos, casas etc.
Outros dizem que ainda há muitas árvores nos morros e, hoje, há um controle severo da Polícia Florestal, cumprindo a lei que proíbe o abate de árvores.
Dois outros entrevistados até sugerem que a proibição do abate poderia ser amenizada, que cada caiçara deveria ter o direito de cortar uma ou duas árvores por ano.

Não se confirmou, portanto, a suspeita que deu origem a essa pesquisa. Missão cumprida.

As estudante que levaram cabo esse trabalho ampliaram sua experiência de vida e passaram a conhecer e interessar-se mais pelo ecossistema da Ilhabela. Na sua maioria, gostaram de realizar a pesquisa. Algumas procuraram saber mais detalhes sobre os entrevistados, sua vida na Ilha, suas opiniões, seu trabalho, a fabricação das canoas. Tiveram a oportunidade de apreciar as condições de controle do abate de árvores, a exigência do plantio de uma muda para cada exemplar adulto derrubado, o que deixa claro a preocupação do legislador com a preservação do ambiente. Obtiveram informações sobre o passado de sua comunidade, a festa de lançamento da canoa ao mar, as modinhas, a oxaria; o comércio da Ilha que mandava para o continente canoas abarrotadas de produtos naturais.
Também os entrevistados gostaram de participar da atividade.

Um dos grupos de alunas foi levado pra ver de perto um pequiá jovem e até planeja fazer um filme sobre árvores.