quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

BROTA POESIA

Lá vem o Sol, gente! (Arquivo JRS)

               Em meados da década de 1970, quando eu vivia no Perequê-mirim, descobri o mundo das letras. Os amigos mais próximos trocavam gibis e revistas, ou seja, todos liam tudo. Não era muito devido a nossa limitação financeira, mas ficávamos contentes. Em casa, tinha fila para quem iria ler na sequência: “Oba! Gibi do Fantasma! Eu primeiro, você depois”. “Agora é a Ana que tá lendo a revista Capricho [fotonovela], mas depois serei eu”. “Eu já tô lendo o gibi da Brotoeja, mas em seguida eu quero o do Topo Gigio”. Era um tempo em que tínhamos aulas até aos sábados. Na verdade, sábado era dia dedicado à leitura. Sábia professora que nos proporcionava isso!
               Os filhos e filhas do Dona Celeste e do Seo Zé Maia eram os que mais se dispunham a trocar tão valiosas mercadorias. O Odilon era o meu melhor parceiro de leituras. Era por isso que a distância entre as nossas casas, em torno de quinhentos metros, parecia até varrido de tanto que por ali passávamos. Papai dizia que era como “carreiro de formigas feito pela criançada”. Era nesse percurso que costumávamos rir com as lorotas do Zé Pretinho (ou Yêieca), com as trapalhadas do Janguinho da Jovina e com os conselhos da Dona Jacinta e do Seo Tomás. Ah! A Dona Maria Graça sempre nos presenteava com bananas maduras e jacas!
               Conversando num dia desses com a amiga Odila Maia, fiquei sabendo de suas participações nos primeiros concursos de poesia. Ótimas reminiscências! “Eu ainda tenho lá em casa cópias daquelas poesias, Zezinho!”. Imediatamente supliquei-lhe que desse um jeito. Desse modo, posso apresentar:

LEMBRANÇAS

Ah! Que saudade tenho
Das tardes ensolaradas!
Eu, criança ainda, a contemplar
Esta praia, este mar, esta paz que só você tinha.

Enseada, coração de Ubatuba,
Em que toda tarde eu ficava a te olhar.
O Velho Fabiano, esguio em sua canoa, a remar;
O Velho Chico Viola, com sua viola a cantar.

Era tudo simples e tão puro.
Tranquilidade era o que existia ali.
Já não existe mais cantador de viola,
Nem canoeiro a remar.
O progresso passou por aqui
E o que restou de ti, Enseada?

Simplesmente as lembranças das tardes ensolaradas.

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